A idade, e lá para as tantas…

A diferença de idade de Bosco para a minha é de um ano e cinco meses.  Ele, setembro de 1948. Eu, abril de 1950. Acontecia de, no meu aniversário, digamos, em 1959, eu completava nove anos. Passava, assim, de oito anos para nove. Ele, com dez. Então, eu, vendo os nove anos se aproximar dos dez dele, ingenuamente, pensava que, no próximo ano, faria dez, e, assim, o  alcançaria. Só que em setembro, o seu aniversário me atrapalhava, Bosco fazendo onze anos, a distância voltava a ser de um ano e cinco meses. Ficava danado, mas calado. Dividir tristeza com os outros não fazia parte do meu gibi. Eu que chorasse no meu próprio ombro.

O projeto de alcançar a idade de Bosco foi obra dos tempos do primário, indo embora sem a gentileza da despedida. Não mostrou as caras no ginásio, sonhos outros apareceram, a gente na mesma série, em turmas diferentes, curso concluído, estávamos no meio dos que, a partir da terceira série, tinha por assunto predileto cursar o secundário no Aracaju, e, aí, nos separamos. Ele, no científico, hóspede da casa de vovô Zeca. Eu, no clássico, na de vovô Aristides. A equiparação da idade desapareceu completamente, quiçá pela palavra impossibilidade, desejo sem raiz, que não resistiu a lógica da vida. Os números não paravam de se movimentar.

Deixando para trás um bocado de tempo, o certo é que os gostos se alteram. O da idade faz parte de página virada. Hoje, aliás, hoje não, desde muito, em lugar de alcançar a idade de Bosco, eu queria era retroagir, ficar cada ano mais novo. Em lugar de setenta e dois, ter sessenta e cinco, no ano seguinte, cinqüenta e nove, e, acima por diante, ladeira a baixo, o carro em permanente marcha ré. Ou então, riscar do calendário a data do meu aniversário. Se não há mais data, não troco de idade. Talvez atingisse o que vovó Brasília achava o máximo: indagar a neta pela sua neta.  Não aludia aos netos. Não alcançou essa alegria, nem a bola passou perto da trave. No muito, foi bisavó de menores impúberes. No fundo, todo esse papo é apenas um meio que a gente, a partir de certo momento, começa a ver os anos se avolumarem, a morte se aproximar da calçada, e, inutilmente, busca um modo de evitá-la. Ou retardá-la, o máximo possível, sem solução alguma. É como o velho locutor de jogos de futebol berrava: o temmmpo paaaassa.

Autor

Vladimir Souza Carvalho

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